A Medida Provisória nº 1.152/22 foi editada no dia 28 de dezembro de 2022 trazendo as tão esperadas mudanças das regras de preços de transferência brasileiras para seu alinhamento com o padrão internacional estabelecido pela Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE).
Enquanto os países vinculados à OCDE adotam o princípio do arm’s length, no Brasil eram adotadas regras de cálculos com margens prefixadas, o que podia levar tanto a uma dupla tributação como a uma dupla não tributação dos resultados de grupos multinacionais. Em razão destes desvios até então existentes no sistema de preços de transferência brasileiro, mudanças tributárias recentes ocorridas nos Estados Unidos deixaram de permitir o desconto de crédito tributário referente ao imposto de renda pago no Brasil.
De toda sorte, é nítdo que a MP 1.152/22 inaugurou novos conceitos, terminologias, métodos e, sobretudo, introduziu o princípio arm’s length, grande norteador de todo o sistema da OCDE, a fim de eliminar algumas distorções que eram objetos de críticas.
A nova legislação ainda depende de conversão em lei e de regulamentação por Instrução Normativa pela Receita Federal do Brasil (RFB), de modo que todos os detalhes da aplicação do princípio arm’s length, das metodologias de cálculos e outros critérios ainda podem sofrer grandes mudanças nas regulamentações posteriores, podendo apresentar
1. Vigência
A nova metodologia se torna obrigatória para todas as empresas brasileiras a partir e 01/01/2024, contudo, o contribuinte já poderá optar pelas alterações da MP nº 1.152/2022 para os fatos geradores a partir 01/01/2023. Esta opção será irretratável, e a RFB ainda irá divulgar a forma, prazo e condições para que o contribuinte manifeste sua opção.
2. Princípio do arm ‘s length
A MP determina a necessidade de observância, pelas empresas, do princípio arm’s length, introduzindo a forma como o contribuinte brasileiro deve aferir esta adequação e ajustar seus impactos para fins da apuração dos tributos sobre a renda.
A nova norma inaugurou na sistemática brasileira a expressão “transação controlada”, assim entendida como qualquer relação comercial ou financeira entre partes relacionadas, estabelecida ou realizada de forma direta ou indireta, incluídos contratos ou arranjos sob qualquer forma e série de transações.
Também houve uma clara ampliação do conceito de partes relacionadas. Antes, a norma brasileira trazia um rol taxativo de situações em que duas partes eram consideradas relacionadas. Agora, esta relação é percebida sempre que se afira que qualquer das partes esteja sujeita a influência direta ou indireta da outra parte, que possa levar a transações em termos e condições que divirjam daqueles que seriam estabelecidos a mercado.
Há grande subjetividade neste ponto, sendo necessário que a RFB ainda regulamente o que se entenderá por “influência” e critérios para avaliação de sua existência caso a caso. Afinal, há inúmeras forças de mercado que levam a condições e termos divergentes dos usualmente praticados, mesmo entre empresas sem nenhuma relação prévia.
Para fins da da aplicação do arm’s length, as transações controladas devem ser confrontadas com transações comparáveis entre partes não relacionadas. Esta comparabilidade é possível quando não houver diferenças que possam afetar materialmente os indicadores financeiros (margem, lucro, etc.) das transações ou puderem ser efetuados ajustes para eliminar os efeitos materiais das diferenças existentes.
Ao contrário dos métodos atuais em que há uma listagem taxativa daquilo que pode ou não ser ajustado nos preços praticados e parâmetros, a nova norma é muito mais abrangente, inova nos fatores que podem ser ajustados (preços, margens de lucro, índices, divisão de lucros, entre outros) e ainda estipula que poderão ser ajustados outros dados considerados relevantes. Neste ponto, mais uma vez, fica evidente a necessidade de maior regulamentação.
A nova metodologia estabelece que, para determinar se as transações são comparáveis, o contribuinte deve (1) realizar o delineamento da transação controlada e (2) efetuar a análise de comparabilidade da transação controlada.
O delineamento da transação controlada deve ser realizado com fundamento na análise dos fatos e das circunstâncias da transação, das evidências da conduta efetiva e as funções desempenhadas por cada parte, os ativos utilizados, os riscos assumidos, as características dos bens, direitos ou serviços, as circunstâncias econômicas das partes e do mercado em que operam, as estratégias de negócios e outras características relevantes.
Na sequência, o contribuinte deve passar à análise de comparabilidade com o objetivo de confrontar os termos e as condições da transação controlada com os termos e condições que seriam estabelecidas entre partes não relacionadas, mediante a análise das características economicamente relevantes das transações; as datas em que foram realizadas; a disponibilidade de informações de transações entre partes não relacionadas; a seleção do método mais apropriado e do indicador financeiro a ser examinado.
Também deve ser considerada a existência e relevância dos efeitos da sinergia de grupo nas transações comparáveis. Tal sinergia decorre das funções desempenhadas, ativos utilizados ou riscos assumidos que produzem uma vantagem ou desvantagem identificável para as partes relacionadas em relação aos demais participantes do mercado. Os benefícios ou prejuízos decorrentes da sinergia de grupo precisam ser alocados entre as partes da transação controlada na proporção de suas contribuições para a criação do efeito de sinergia e ficarão sujeitos à compensação.
3. A seleção do método mais apropriado
A nova metodologia discorre acerca da “seleção do método mais apropriado” para a aplicação do arm’s length, em oposição à norma anterior que permitia a opção por qualquer dos métodos previstos. Destarte, o contribuinte deve selecionar o método que forneça a determinação mais confiável dos termos e das condições que seriam estabelecidos entre partes não relacionadas em uma transação comparável, considerados aspectos como os fatos e as circunstâncias da transação controlada, a disponibilidade de informações confiáveis de transações comparáveis realizadas entre partes não relacionadas necessárias à aplicação consistente do método e o grau de comparabilidade entre as transações, incluídas a necessidade e a confiabilidade de se efetuar ajustes para eliminar os efeitos de eventuais diferenças entre as transações comparadas.
Também há previsão de que o método Preço Independente Comparado (PIC) será considerado o mais apropriado sempre que houver informações suficientes e confiáveis para sua utilização.
Há ainda a possibilidade de adoção de outros métodos não previstos na legislação e não regulamentados pela RFB, desde que os métodos previstos não sejam aplicáveis à transação controlada ou não produzam resultados confiáveis.
Métodos previstos na IN nº 1.152/22:
Preço Independente Comparável – PIC, que consiste em comparar o preço ou o valor da contraprestação da transação controlada com os preços ou os valores das contraprestações de transações comparáveis realizadas entre partes não relacionadas;
Preço de Revenda menos Lucro – PRL, que consiste em comparar a margem bruta que um adquirente de uma transação controlada obtém na revenda subsequente realizada para partes não relacionadas com as margens brutas obtidas em transações comparáveis realizadas entre partes não relacionadas;
Custo mais Lucro – MCL, que consiste em comparar a margem de lucro bruto obtida sobre os custos do fornecedor em uma transação controlada com as margens de lucro bruto obtidas sobre os custos em transações comparáveis realizadas entre partes não relacionadas;
Margem Líquida da Transação – MLT, que consiste em comparar a margem líquida da transação controlada com as margens líquidas de transações comparáveis realizadas entre partes não relacionadas, ambas calculadas com base em indicador de rentabilidade apropriado;
Divisão do Lucro – MDL, que consiste na divisão dos lucros ou das perdas, ou de parte deles, em uma transação controlada de acordo com o que seria estabelecido entre partes não relacionadas em uma transação comparável, consideradas as contribuições relevantes fornecidas na forma de funções desempenhadas, ativos utilizados e riscos assumidos pelas partes envolvidas na transação.
4. Commodities
A MP também traz alterações no que tange às transações com commodities. Até então, as operações deviam obrigatoriamente seguir métodos diferenciados (Pecex nas exportações e PCI nas importações), com previsões específicas para a comparabilidade de preços praticados e cotações e índices de mercado para estes produtos.
Pelas novas disposições, o método PIC será considerado o mais apropriado para determinar o valor da commodity transferida na transação controlada, estando nele incluída a comparabilidade com cotações ou índices obtidos em bolsas de mercadorias e futuros, agências de pesquisa ou agências governamentais, devendo os preços das cotações e índices serem ajustados pelas condições específicas da transação controlada.
Esta mudança de método, portanto, não se traduz necessariamente em inovação para os contribuintes que operam com commodities, na medida em que as cotações e índices ajustados já são a base do Pecex e do PCI, e continuarão a serem utilizados no PIC por se tratarem de informações confiáveis para estabelecer os preços em transações comparáveis. Por outro lado, em que pese esta tendência para que as bases de informações continuem as mesmas, certamente a metologia de comparação sob a égide do arm’s length acarretará em impactos divergentes dos atualmente experimentados por estas empresas, mas isso só será melhor compreendido com as regulamentações que estão por vir.
5. Indicadores financeiros
No caso da aplicação de métodos que conduzam à utilização de um intervalo de observações de indicadores financeiros (margens de lucro, preços, etc) de transações comparáveis, devem ser priorizados os indicadores de transações entre partes não relacionadas que possuam o maior grau de comparabilidade em relação à transação controlada, e excluídos indicadores provenientes de transações de menor grau de comparabilidade.
Havendo um grau equivalente de comparabilidade entre as transações da amostra, deve ser utilizado o intervalo completo das amostras na comparação. Contudo, quando existirem incertezas em relação ao grau de comparabilidade entre as transações comparáveis, o intervalo dos indicadores a ser considerado na comparação será o intervalo interquartil, o qual permite sejam desprezados os extremos superiores e inferiores em relação à mediana quando há grande dispersão dos dados da amostra.
Há ainda a possibilidade de utilização de outros recursos estatísticos na elaboração da comparação, o que deve ser regulamentado pela RFB.
6. Ajustes de TP às bases de cálculo de IRPJ e CSLL
A MP prevê os seguintes ajustes à base de cálculo do IRPJ e da CSLL:
- Ajuste espontâneo: é aquele efetuado pelo próprio contribuinte na apuração da base de cálculo do IRPJ e da CSLL;
- Ajuste compensatório: é aquele efetuado pelas partes da transação controlada até o encerramento do ano-calendário em que for realizada a transação com vistas a ajustar o seu valor de tal forma que o resultado obtido seja equivalente ao que seria obtido nos termos e condições de mercado; trata-se, portanto, de um ajuste do valor da operação, com impactos contábeis e não apenas nas bases de apuração dos impostos.
- Ajuste primário: é aquele efetuado pela autoridade fiscal na apuração da base de cálculo do IRPJ e da CSLL;
- Ajuste secundário: é aquele decorrente dos ajustes espontâneo ou primário, e deve ser considerado como um crédito concedido entre as partes envolvidas na transação controlada para ajustar o preço da transação ao preço esperado pela aplicação do arm’s length principle. Trocando em miúdos, caso a aplicação do arm’s length revele que o preço praticado na operação controlada foi maior ou menor que o valor de mercado, a parte que realizar o ajuste espontâneo ou tiver lançado o ajuste primário em sua apuração deverá considerar este mesmo valor como um ajuste secundário devido à outra parte da transação. Este crédito entre as partes será remunerado à taxa de juros de 12% ao ano.
Como já era previsto, fica vedada a realização de qualquer ajustes de exclusão nas bases de cálculo do IRPJ e da CSLL, que impactem portanto na redução de tributos a pagar ou no aumento dos prejuízos fiscais, ainda que a aplicação do princípio arm’s length indique que os termos e condições da transação controlada levariam a isso. A novidade fica na possibilidade dos ajustes compensatórios, os quais podem ser realizados para reduzir os preços a pagar/receber, mesmo que isso venha a diminuir o lucro tributável no Brasil, e desde que decorram da aplicação do arm’s length principle.
7. Disposições sobre transações específicas
A MP 1.152/22 trouxe disposições sobre transações específicas, sempre em vistas de conduzir ao seu delineamento conforme a aplicação do princípio arm’s length.
7.1. Transações com intangíveis: Devem ser delineadas as transações com intangíveis, passíveis ou não de registro contábil, e ainda que sejam de difícil valoração, ou seja, os que não detém transações comparáveis e carregam elevado grau de incerteza em sua avaliação. A remuneração destas transações não poderá ultrapassar a taxa de juros livre de risco ou a taxa de juros ajustada ao risco assumido, a depender do caso.
7.2. Serviços intragrupo: Considera-se prestação de serviço qualquer atividade desenvolvida por uma parte, incluídos o uso ou a disponibilização pelo prestador de ativos tangíveis ou intangíveis ou outros recursos, que resulte em benefícios para uma ou mais partes. A MP também prevê hipóteses em que não se estará diante da prestação de serviços por não haver benefícios para as partes, quais sejam, quando a atividade for caracterizada como atividade de sócio ou caso a atividade represente a duplicação de um serviço já anteriormente prestado.
7.3. Contratos de compartilhamento de custos: São contratos em que são previstos compartilhamento de custos, contribuições e riscos relativos à aquisição, à produção ou ao desenvolvimento conjunto de ativos com base na proporção dos benefícios que cada parte espera obter no contrato. Está previsto que, nas hipóteses em que a contribuição do participante não for proporcional à sua parcela no benefício total esperado, serão efetuadas compensações adequadas entre os participantes do contrato, de modo a restabelecer o seu equilíbrio.
7.4. Reestruturação de negócios: As reestruturações de negócios são consideradas as modificações nas relações comerciais ou financeiras entre partes relacionadas que resultem na transferência de lucro potencial ou em benefícios ou prejuízos para qualquer uma das partes e que seriam remuneradas caso fossem efetuadas entre partes não relacionadas.
7.5. Operações de dívida: A MP diferencia operações de dívida e operações de capital, prevendo a indedutibilidade de quaisquer juros decorrentes de transações delineadas como operações de capital. Para as operações de dívidas, a remuneração ficará limitada à taxa de retorno livre de risco ou à taxa de retorno ajustada ao risco, a depender das características da operação. Mais uma vez, em que pese se tratarem de taxas em geral compatíveis com o mercado, há a estipulação de margens máximas fixas.
7.6. Garantias intragrupo: Prestação de garantia na forma de um compromisso legalmente vinculante da parte relacionada de assumir uma obrigação específica no caso de inadimplemento do devedor.
7.7. Acordos de gestão centralizada de tesouraria: Nas transações de gestão centralizada de tesouraria, também conhecidas como caixa único, conta-corrente ou cash pooling, deverá ser considerado se o contribuinte parte do acordo aufere benefícios proporcionais às contribuições que efetua ou se sua participação se restringe a conceder financiamento às demais partes da transação. Há também a previsão de que a parte que desempenhar a função de coordenação do referido acordo poderá auferir remuneração. As disposições são especialmente relevantes na medida em que este é um tema constantemente objeto de questionamentos pela fiscalização, sobretudo envolvendo partes no exterior, na medida em que a RFB sempre busca descaracterizar a gestão centralizada de caixa para caracterização de mútuo.
7.8. Contratos de seguro: Transações em que uma parte assume a responsabilidade de garantir o interesse da outra parte contra riscos predeterminados mediante o pagamento de prêmio, e que seja delineada como serviço.
8. Penalidades
A MP prevê multas pesadas para o descumprimento de suas determinações, com valor mínimo de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) e valor máximo de R$ 5.000.000,00 (cinco milhões de reais), nas seguints hipóteses e percentuais que seguem:
- Obrigação acessória intempestiva: 0,2% por mês calendário ou fração sobre o valor da receita bruta do período a que se refere a obrigação.
- Obrigação acessória informações inexatas, incompletas ou omitidas: 5% do valor da transação correspondente ou 0,2% da receita consolidada do grupo multinacional do ano anterior ao que se referem as informações.
- Obrigação acessória que não atenda aos requisitos de apresentação: 3% da receita bruta do período a que se refere a obrigação.
- Não apresentação de informação ou documentação solicitada durante fiscalização: 5% do valor da transação correspondente.
A autoridade fiscal poderá autorizar o contribuinte a retificar a declaração ou a escrituração fiscal exclusivamente em relação aos ajustes de preços de transferência para a sua regularização. Neste caso, não poderão ser aplicadas penalidades sobre as informações retificadas.
9. Procedimentos administrativos
9.1. Medidas de simplificação: A Receita Federal poderá estabelecer regramentos específicos para disciplinar a aplicação do princípio arm’s length a situação determinadas, simplificar ou dispensar a apresentação de documentação. Também poderá detalhar as transações já mencionadas na MP e outras não mencionadas.
9.2. Consultas à RFB: Uma novidade trazida pela MP é a possibilidade de realizar consultas à Receita Federal para alinhar previamente pontos relacionados a operações sujeitas às regras elencadas na MP. Nestes casos, porém, será necessário o pagamento de uma taxa de R$ 80 mil. A consulta tem validade de quatro anos e, para a extensão da vigência, é necessário o pagamento de mais R$ 20 mil.
9.3. Procedimento amigável: Previsão para que a autoridade fiscal revise, de ofício, o lançamento efetuado para implementar os resultados de acordados em mecanismos de solução de disputa previstos no âmbito de acordo ou convenção internacional para eliminar a dupla tributação de que o Brasil seja signatário. Este procedimento será regulamentado pela RFB.
10. País de tributação favorecida
Outra importante alteração da MP corresponde ao que atualmente se entende por país de tributação favorecida (paraíso fiscal). A legislação atual prevê que os países de tributação favorecida são aqueles que tributam a renda à alíquota máxima inferior a 20% (vinte por cento). A MP 1.152/22 reduziu este percentual para 17% (dezessete por cento).
Ou seja, menos países irão se enquadrar como tributação favorecida a partir da nova norma, sendo provável que a RFB altere em um futuro próximo a IN nº 1.037/10. A redução de 20% para 17% ainda se encontra acima do imposto mínimo global de 15% defendido pela OCDE, de modo que muitas jurisdições ainda permanecerão tratadas como paraísos fiscais pela legislação brasileira.
11. Concomitância das regras de TP, TBU e subcapitalização
Nas disposições finais, foram tratadas e mantidas as disposições atinentes a evitar a dupla tributação dos resultados de TP também incluídos em outros cálculos exigidos pela legislação tributária, tais como Tributação em Bases Universais (TBU) e subcapitalização.
12. Royalties e assistência técnica, científica, administrativa ou semelhante
A MP estipula que os royalties despesas a título de royalties e assistência técnica, científica, administrativa ou semelhante, não são dedutíveis das bases de IRPJ e da CSLL quando as beneficiárias forem entidades residentes ou domiciliadas em país com tributação favorecida ou que sejam beneficiárias de regime fiscal privilegiado ou partes relacionadas quando a dedução dos valores resultar em dupla não tributação (por tratar-se de despesa dedutível para outra parte relacionada ou por não se tratar de rendimento tributável no país para o qual foi pago o rendimento).
Necessário observar que a indedutibilidade total destas despesas, sem qualquer possibilidade de abatimento dos montantes de imposto pagos no exterior ainda que em montante inferior a 17%, leva a uma dupla tributação. Por consequência, há inconsistência neste ponto em relação à aplicação do arm’s length.
13. Conversão em lei e regulamentação
Ponto fundamental é relacionado com a vigência e regulamentação. A MP 1.152/22 precisa passar pelo Congresso para ser convertida em lei e surtir efeitos. O Congresso Nacional tem o prazo máximo até 1º de junho para analisar o texto, sob pena de perda de objeto, entretanto, enquanto isso, a MP gera efeitos.
14. Conclusões
Em nossa visão, a MP nº 1.152/22 caminha bem rumo à padronização das normas internacionais, pois introduz conceitos, métodos e sobretudo o arm’s length, grande princípio norteador dos preços de transferência no âmbito da OCDE. Ainda há, porém, um bom caminho para a concretização deste alinhamento.
Mesmo com a conversão da MP em lei, caberá à Receita regulamentar diversos pontos da norma. Será necessário esclarecer, por exemplo, quais dados os contribuintes poderão utilizar para a comparação das operações envolvidas com operações entre partes relacionadas e como se dará o sistema de consultas.
Ademais, considerando o princípio da anualidade aplicável ao Imposto de Renda, ainda que a MP seja convertida em lei em meados de 2023, as novas regras só valerão a partir de 2024. O texto da medida provisória, porém, abre a possibilidade para que os contribuintes façam a opção pelas novas regras em 2023.
Neste momento, frisamos que as empresas devem agir com cautela e estratégia, pois a nova metodologia é complexa, depende ainda de trâmites legais e regulamentações, e pode sofrer alterações e esclarecimentos sobretudo nestes primeiros momentos. Uma opção apressada pela antecipação dos efeitos da MP pode gerar erros, custos altíssimos de compliance e autuações para os contribuintes.
Em vista disso, nossa dica de ouro é a de que o ano de 2023 pode (e deve!) ser usado para estudo e compreensão da nova metodologia, bem como para a elaboração de simulações para confrontar os resultados do modelo vigente versus os resultados do modelo da MP nº 1.152/22.
Assim, as empresas poderão chegar em 2024 preparadas para esta realidade, com a compreensão dos impactos que ela irá gerar nos cálculos de TP e nas bases de cálculo de IRPJ e CSLL.