O ICMS Difal ou Diferencial de Alíquota do ICMS vige há muito tempo nas operações entre pessoas jurídicas tendo por objetivo proporcionar o equilíbrio na arrecadação de imposto entre os estados, dessa forma, nas transações interestaduais há a divisão da cobrança entre o estado de origem e o estado de destino. Nas operações que envolviam não contribuinte, a arrecadação ficava apenas com o estado de origem, gerando uma centralização de renda nos estados do sul e sudeste em desprestigio dos demais estados, em que há o mercado consumidor. A Emenda Constitucional nº 87/2015 alterou o artigo 155 da Constituição Federal e trouxe também a repartição do imposto entre os estados, sendo que a regulamentação era realizada através do Convênio CONFAZ nº 93/2015.
No início de 2021 foi decidido pelo STF que todo o procedimento de compensação deveria ser ordenado por lei complementar. Inclusive, o Min. Toffoli deu uma colher de chá aos estados e manteve a cobrança inconstitucional até o final de 2021, prazo concedido para que foi editada a lei complementar. Ao final do mesmo ano, foi aprovada a Lei Complementar nº 190 com sanção presidencial em janeiro de 2022, desencadeando a discussão acerca do início da vigência dos dispositivos.
Os estados tiveram cerca de um ano para pressionarem o congresso a trabalhar e nada fizeram. A lei apenas foi sancionada no ano seguinte e por conseguinte deveria atender aos princípios da anterioridade – anual e nonagesimal.
Enquanto as associações da indústria e comércio argumentavam que a cobrança só poderia ser exigida em 2023, os Estados se pautavam na tese de que se não houvesse a cobrança do DIFAL em 2022 as arrecadações poderiam sofrer declínio.
Recentemente, em decisão majoritária proferida no julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade 7066, 7078 e 7070, o Supremo Tribunal Federal estabeleceu que o recolhimento do DIFAL sobre operações destinadas ao consumidor final deve viger sobre as operações ocorridas 90 dias após a data da publicação da LC 190/2022.
O voto prevalecente foi do Ministro Relator Alexandre de Moraes, que justificou sua decisão baseado no princípio da anterioridade nonagesimal, ou seja, de que a lei deve produzir efeito após 90 dias da data de sua publicação, bem como na tese de que não há aplicabilidade do princípio da anterioridade anual, posto que a LC 190/2022 não criou novo tributo, mas apenas regulamentou a distribuição de arrecadação tributária, de forma que não houve prejuízo para o contribuinte.
Os votos vencidos, como por exemplo do Ministro Edson Fachin, foram fundamentados no princípio da anterioridade anual. Segundo a argumentação do Ministro, embora o DIFAL não tenha sido criado pela referida LC, não é possível que o tributo nela previsto e regulamentado seja passível de cobrança no mesmo exercício financeiro.
Absurdamente, não foi este o entendimento final da suprema corte de justiça do Brasil. Temos uma vergonhosa decisão política e econômica, que descaradamente rasga a constituição nacional.
Inclusive, trata-se de uma paradoxal decisão, pois se não havia a instituição de novo tributo, por qual razão seria necessária a regulamentação via lei complementar nos termos do artigo 146 da Constituição Federal? Vemos que o STF se achou “esnucado” pela primeira decisão proferida, que atendia a legalidade, mas não contou com a preguiça dos estados em legislar. Logo, precisou inventar uma regra, ignorar a constituição para poder não afetar os orçamentos e finanças do estado em 2022, que teria que devolver milhões de reais aos contribuintes.
Infelizmente, este é o judiciário que temos construído, em que a suprema corte conta cada vez mais com ministros políticos e não técnicos.