I. Introdução
A 1ª Turma Ordinária da 3ª Câmara da 3ª Seção do CARF, em sessão realizada no dia 29/07/25 (Acórdão 3301-014.486 | Processo 13136.720648/2022-26), deu provimento ao recurso do contribuinte e afastou a cobrança de IOF/Crédito sobre os lançamentos de conta corrente intercompany (intragrupo), por entender que as movimentações financeiras funcionavam como mecanismo de compensação de obrigações e não como mútuo.
Em linha com o art. 13 da Lei 9.779/1999 e a definição civil de mútuo (art. 586 do Código Civil), o colegiado concluiu que mero fluxo financeiro multidirecional e oscilante entre empresas de um mesmo grupo, sem juros, sem obrigação de devolver numerário certo em prazo certo e com apuração periódica de saldo, não configura fato gerador do IOF.
Trata-se de um importante precedente para grupos empresariais que demandam uma gestão mais dinâmica de fluxo de caixa. Abordaremos abaixo os principais destaques do julgado.
II. Pontos Considerados pelo CARF
Os principais pontos determinantes para afastar a cobrança do IOF foram:
- Inexistência de juros (remuneração pelo capital): no contrato do contribuinte havia apenas a previsão de atualização monetária por índice oficial até a data de balanço;
- Apuração/fechamento periódico do saldo (“realização de balanço”): anualmente, em 31/12 (por padrão), era feito um fechamento dos saldos;
- Fluxo multidirecional, com saldos oscilantes entre contas de ativo (saídas) e passivo (entradas) para cada contraparte: o passivo era zerado em 31/12 com transporte de saldo para o ativo, evidenciando compensação e não “empréstimo” tradicional;
- Registros contábeis espelhados e padronizados por contraparte (duas contas por relação): existência de controles entre ECD e planilhas gerenciais;
- Ausência de obrigação contratual de devolver quantia certa em prazo certo, nem garantias ou instrumentos típicos de dívida: as partes não se tornavam credor/devedor contratuais enquanto o arranjo de compensação perdurasse;
- Distinção expressa em relação a operações fora do grupo ou unidirecionais: reconhecimento do IOF quando se do repasse a empresa não pertencente ao grupo.
Em síntese, a decisão demonstra uma abordagem mais profunda do tema, mostrando que não é apenas o “nome” conta corrente que afasta o IOF, mas sim o funcionamento como conta de compensação, ou seja, sem “preço” do dinheiro, sem obrigação de restituição típica e com fechamentos periódicos por encontro de contas.
III. Critérios Práticos
A decisão também trouxe certos critérios práticos que, se adotados pelos contribuintes, podem ajudar na estruturação do contrato e trazer maior segurança jurídica.
Um dos critérios foi a existência de contrato/política intragrupo claro, com a definição da finalidade de compensação, ausência de juros, não fixação de cronograma de “devolução”, não oferecimento de garantias e não existência de saldo devedor crônico e direcional (funding unilateral) foram elementos determinantes.
Ademais, também foi um critério importante no caso concreto a existência de uma contabilidade espelhada por contraparte, com manutenção de contas (ativo/passivo) por empresa relacionada, bem como a utilização de históricos padronizados, zeramento do passivo no fechamento (com transporte ao ativo quando houver saldo) e a evidência de fluxo multidirecional.
Por fim, a completa auditoria dos documentos e a montagem de um book contábil e financeiro com extratos, conciliações e planilhas suportes foram também importantes na formação do convencimento dos julgadores.
IV. Conclusão
O precedente não “libera” toda e qualquer movimentação intragrupo: ele valida a modalidade conta corrente de compensação quando a forma é coerente com a substância operacional e contábil. Seguindo os critérios de segurança e evitando os sinais de risco, é possível reduzir de maneira relevante a exposição a IOF sem comprometer a eficiência do capital de giro do grupo.





