Recentemente o Governo Federal editou o Decreto nº 10.854/2021 que regulamenta diversos temas relativos à legislação trabalhista, dentre eles o Programa de Alimentação do Trabalhador – PAT, antes regulamentado pelo Decreto nº 5/1991.
O PAT foi instituído como um estímulo para as pessoas jurídicas concederem a seus empregados alimentação de qualidade, seja via concessão de alimentos, verba direta, indireta e ainda fornecimento de alimentação in loco. Em contrapartida, a legislação oferta benefício tributário consistente na dedução no cálculo do IRPJ desta despesa, conforme artigo 1° da Lei nº 6.321/1976 e artigo 645 do Decreto nº 9.580/2018 (RIR).
De longa data se observa que o Poder Executivo vem tentando reduzir o benefício tributário do PAT, sendo que a mais nova criação do Executivo está no Decreto nº 10.854/2021, que limita a dedução do IRPJ às despesas vinculadas aos trabalhadores que percebam até 05 salários mínimos, sendo que a dedução para os demais trabalhadores apenas vale se a alimentação for fornecida mediante serviço próprio de refeições ou de distribuição de alimentos por meio de entidades fornecedoras de alimentação coletiva.
De todo modo, caso o benefício seja aplicado de forma distinta ao acima previsto, a dedução deve se limitar à parcela salarial equivalente a um salário-mínimo.
Essas restrições são questionáveis juridicamente por que criadas por decreto e limitam o benefício previsto em lei. Deste modo, estamos diante de uma notória violação ao Princípio da Legalidade.
A autorização ao Poder Executivo para regulamentar a lei objetiva viabilizar sua aplicação, traçar diretrizes, mas não instituir obrigações ou benefícios não previstos em lei. Um decreto jamais pode dizer mais ou diferente do que é dito pela lei.
No mais, as disposições do Decreto nº 10.854/2021 também ofendem a isonomia, pois não há a menor correlação entre ter o direito de deduzir ou não o IRPJ em razão de um funcionário ganhar mais ou menos, já que o salário dele não entra na conta tributária relativa à despesa.
Em arrimo, negar o benefício ao PAT em razão salarial é dizer que o funcionário melhor remunerado não faz jus à uma alimentação de qualidade. O decreto viola a finalidade clara da Lei nº 6.321/1976, o que também revela a sua ilegalidade.
Neste cenário, a restrição criada pelo Decreto deturpa o fim do PAT, que ao invés de fomentar o incentivo a uma alimentação de qualidade, pode onerar ainda mais a subsistência dos trabalhadores, até porque uma inflação na casa dos dois digitais restringe a renda de qualquer trabalhador, sendo que o efeito é muito mais profundo e denso que a expressão numérica de um salário.
Ainda sob o viés tributário, considerando que o decreto tem sua vigência prevista para 12.12.2021, a restrição na dedução do PAT revela majoração de tributo que ofende o Princípio da Anterioridade. Logo, mais uma ilegalidade no decreto presidencial.
Diante de todo o exposto, observa-se que a alteração no artigo 641 do Regulamento do Imposto de Renda pelo Decreto nº 10.854/2021 é ilegal e inconstitucional, sendo que esta limitação tributária e social deve ser questionada judicialmente.